segunda-feira, 15 de março de 2010

A DECISÃO INCOMPREENSIVEL DE QUEM POUCO COMPREENDE


Não tenho nada nem contra nem a favor dos gays. Enfim, corrijo, tenho algumas coisas contra. Irrita-me solenemente que os melhore jogadores do campeonato joguem na sua equipa, que sejam os mais bem-vestidos das festas e que tenham um impecável gosto pela decoração. Não poderiam ter isso tudo e ainda assim gostarem de mim também? Se assim fosse, seriam perfeitos. Como não o é, irritam-me solenemente.
Este meu sentimentozinho de vingançazinha está, de resto, bastante difundido na sociedade. Irrita-nos tudo o que não é como nós gostaríamos e todos os que não fazem aquilo que desejaríamos. Assim explico eu que as leis da maior parte dos países impeçam os homossexuais de adoptar e que pais que tenham assumido essa opção sexual nem tivessem sido ponderados para efeitos de poder paternal e, inclusive, judicialmente impedidos de visitar os filhos.
Há uns meses atrás o refugo da silly season brindou-nos com outra notícia para nos fazer pensar nestas coisas: Sir Elton John e o seu companheiro pretendiam adoptar um rapaz de 14 anos, seropositivo, que vivia numa instituição ucraniana, e foi impedido pelo governo do país, que alegou que Elton John não só não tinha família constituída como, além disso, ultrapassava a idade fixada na lei nacional para adoptar.
O segundo argumento vale o que vale. A maior parte dos ordenamentos jurídicos determina uma idade máxima para os adoptantes, que podemos discutir, e que no caso é discutível, porque não me chegam aos ouvidos que pais de idade mais avançada sejam necessariamente inaptos, como aliás o demonstram as inúmeras histórias de crianças educadas por avós.
Já o primeiro argumento esconde na verdade um terceiro, que o governo não disse. Como poderia? Seria politicamente perigoso faze-lo, atendendo aos poderosos lobbies gays que se começam a formar. É que, como ninguém esconde, e muito menos ele, Sir Elton John é gay. Bicha. Laricas. Maricas. Paneleiro. Essas coisas todas simpáticas com que brindamos aquilo que não compreendemos.
Ora, todos sabemos que o melhor critério para aferir um bom pai é a sua orientação sexual. Nem poderia ser de outra forma. Até porque circulam por aí estudos científicos que demonstram comprovadamente que os gays são todos um bando de pedófilos depravados. O problema, meus caros, é que eu nunca tive acesso a nenhum desses estudos nem nunca ninguém me conseguiu demonstrar com argumentos racionais (racionais, note-se, não motivações fundadas em preconceitos religiosos ou de consciência pessoal) que (agora por pontos, à boa maneira jurídica):
i) Pais homossexuais tragam para o mundo filhos homossexuais;
ii) A homossexualidade seja uma doença perniciosa a infectar a sociedade;
iii) Os homossexuais sejam pedófilos.
No dia em que alguém me demonstrar isto eu assino por baixo da decisão do governo ucraniano. Sou uma pessoa razoável (razoavelmente teimosa, diriam alguns) e quando me demonstram que estou errada sou capaz de o reconhecer. Mas enquanto estivermos a falar de duendes, histórias de faz-de-conta e gente maléfica que gosta de pessoas do mesmo sexo, não contem comigo para assinar o que seja. Muitos menos para passar certificados de verdade cientifica e jurídica a convicções fundadas no temor daquilo que ultrapassa as nossas o nosso curto entendimento.

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