quarta-feira, 10 de novembro de 2010

QUANDO A VIDA NOS CORRER BEM


Há dias, em conversa com um bom amigo, ele disse uma coisa que a mim e à minha mente distorcida, pareceu realmente assombrosa:
“Se a vida me correr bem, acredito que possamos ficar juntos”.
Referia-se à namorada, uma alminha perdida absolutamente apaixonada por ele, que almejava a utópica (será?) fantasia de envelhecerem lado a lado.
E eu pensei que este homem, que é um dos meus melhores amigos, uma das pessoas que mais admito, mais inteligente que conheço, mais isto e mais aquilo, na verdade, e neste particular, não consegue ver mais além do que a sua vista alcança. Como diria alguém, está preso na alegoria da caverna.
É que as pessoas não decidem partilhar os seus destinos quando a vida lhes corre bem mas, bem pelo contrário, a vida corre-lhes bem quando partilham os seus destinos.
Como é que alguém pode pensar que a sua vida a dois está dependente de um bom emprego, DE um bom salário ao fim do mês, da estabilidade e do conforto? Se assim fosse, sobretudo em momentos de crise aguda como esta, cada um de nós arrumaria as suas tralhas e montaria vida sozinho, à espera de melhores dias financeiros e, consequentemente, amorosos.
A vida é tudo menos simples. Está cheia de problemas, de revés, de retrocessos, de dramas, de contas por pagar, de despedimentos, de empréstimos bancários a assaltar-nos as poupanças, de procuras de empregos, de mortes, de doenças, de discussões… should I go on? O que torna esses dias menos felizes um bocadinho mais felizes é precisamente saber que ao final do dia chegamos a casa e temos lá alguém que não se importa com o carro que conduzimos ou o dinheiro que temos na carteira, e que só quer que cheguemos a casa depressa para se enroscar em nós e nos fazer sentir melhor. Quando isso acontece a vida corre-nos bem.
A minha vida ultimamente tem sofrido muitos desaires. E por vezes sinto-me vir abaixo. Há momentos em que apetece desistir, fechar-nos em casa e não sair mais até que o mundo acabe. Mas, apesar de tudo, acho que a vida me corre bem.
Não tenho a menor dúvida de que este meu amigo vai ter um futuro brilhante. É uma pessoa muito talentosa, batalhadora, corajosa, bem-formada. Daqui a uns anos vai viver numa casa com um ecrã gigante, conduzir uma mota ainda maior, viajar para onde quiser, e, mais importante do que isso, vai ter o tal emprego de sonho, do seu sonho de menino. Mas se porventura essas coisas não acontecerem agora mesmo, a brevíssimo prazo, ele a acredita que não pode partilhar com mais ninguém o pouco que tem, até porque assim se concentra mais nos seus objectivos, sem se distrair nem se afeiçoar. Por isso pode suceder que nessa altura, quando finalmente viva o seu sonho, e a vida “lhe corra bem”, não tenha ninguém à sua espera ao chegar a casa. Ou melhor, poderá ter as pessoas que lhe der na realíssima gana, que na verdade as mulheres gostam de homens bem-sucedidos, mas nenhuma estará lá por ele, e sim pela vida que ele tem. Ele acredita que não sentirá falta disso. Porque a única coisa que sente falta é do seu sonho.
Quase gostava que estivesse correcto. Para bem dele, gostava que tivesse razão. Mas tenho para mim que nesses momentos gloriosos que encherão os seus anos vindouros vai haver dias em que chegue a casa e gostaria de ter alguém que lhe fizesse uma festa na cabeça, que perguntasse como foi o dia. Alguém que lhe ligue a perguntar porque é que ainda não chegou a casa, se está tudo bem, se vai querer peixe ou carne ao jantar. Que mais não seja alguém que sinta a sua falta quando não esteja, que chora por ele, que sofra por ele.
Meu amigo, as pessoas não ficam juntas quando a vida lhes corre bem. A vida é que lhes corre bem quando estão juntas.

1 comentário:

  1. Andei semanas a pensar num post que pudesse ilustrar com esta foto. Adoro de paixão a foto. Não consegui, passou, enfim. Ainda bem que a usaste e, sobretudo, ainda bem que foi neste texto. É mesmo assim, pipoca. Temos de dançar conforme a música. Não podemos ambicionar a perfeição para depois, com jeito, meter mais uma pessoa na roda. Corremos o risco de já não ter ninguém para chamar. Ou de nunca mais nos habituarmos a não dançar sozinhos. E toda a gente sabe que há coisas que sabe bem melhor fazer aos pares :)
    Beijos e xis*

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