sexta-feira, 12 de novembro de 2010

O gene da felicidade


Há quem toque Chopin. Há quem dê saltos acrobáticos no ar. Há quem cozinhe soufflé sem que fique amarrotado no fundo da forma. E há quem faça as pessoas felizes. Refino o meu pensamento: há quem consiga fazer uma pessoa, uma em particular, muito feliz.
Isto de fazer alguém feliz não é para todos. É um dom, um talento, uma graça, uma bênção, sei lá. Tornando a afirmação mais científica, direi que é uma benesse do nosso ADN que permite a alguns fazer os outros felizes.
Bem sei que numa primeira abordagem parece coisa simples. Se lhe fizermos as vontades ela, a outra pessoa digo, será feliz. Se apreciarmos as coisas de que ela gosta, se nos interessarmos pela sua vida, se a tratarmos com carinho e respeito, se a fizermos sentir importante e desejada… porque não há-de ela ser feliz? Bem… porque as relações humanas não são uma fórmula química, de modo que não basta juntar os elementos correctos num tubo de ensaio para descobrir o elixir da felicidade.
Não vos aconteceu já pensarem que estão a fazer tudo bem, ou melhor, saberem que estão a fazer tudo bem, e mesmo assim não conseguirem chegar lá? Amam o outro com paixão e devoção, fazem-no sentir a última bolacha do pacote, tentam tornar-lhe a vida mais fácil, mais prazenteira, mas mesmo assim aquela irritante vozinha interior continua a dizer-vos que fracassaram enormemente. E o pior é que a bendita da vozinha tem quase sempre razão (neste aspecto, é como as mães), de modo que um dia o “Ele” ou a “Ela” se viram para vocês e dizem: “Tu não me fazes feliz”. E nós até já sabíamos. Mas quando é dito assim, em voz alta, íris na íris, simplesmente, torna-se mais real. E é uma dor imensa. Como dor de dentes, dor menstrual e dor de ouvidos tudo junto, numa mesma dor interior.
Este “falhanço felicitário” não resulta do muito ou pouco que se goste do outro. Mas resulta sem dúvida do muito ou pouco que o outro gosta de nós. A dura verdade é esta: todos somos felizes com as pessoas de quem gostamos. É cruel, bem sei, mas ninguém disse que as relações humanas são para meninos. Quando gostamos de alguém podemos ser ignorados, menosprezados, e todas as coisas negativas terminados em “ados” e, mesmo assim, continuamos… apaixonados. Ados. Existe ali uma qualquer espécie de felicidade masoquista por força da qual basta a pessoa existir e estar ali ao nosso lado para nos fazer felizes. Pelo contrário, quantas vezes não tivemos já verdadeiros anjos nas nossas vidas, que se dedicaram a nós de alma e auréola, mas com quem nunca fomos verdadeiramente felizes?
Dito isto, concluo que fazer o outro feliz passa muito pelo quanto conseguimos cativá-lo e fazer com que se afeiçoe a nós. Não é tanto a forma como o tratamos, mas a forma como o apaixonamos. E ao que parece essa é uma questão de feromonas, de áureas, de coisas inexplicáveis tipo Poltergeists e zombies…. Caramba, será o amor um filme de terror?
Moral da história: alguns de nós que vivemos neste planeta não conseguimos ser gostados como manda a lei e, por conseguinte, sofremos de uma inaptidão crónica para fazer o outro feliz. Esta é uma doença grave e incurável, que acarreta consigo muito sofrimento, e que conduz a uma morte lenta e atroz. Não se trata de uma incapacidade que possa ser suprida com estudo e investigação. É que eu ainda pensei em procurar um explicador, ou uma daquelas formações pós-laborais, ou um curso por correspondência que fosse, para ver se consigo aprender a fazer alguém feliz. Mas estou em crer que isto é como uma arte: posso treinar a vida toda mas se não tiver em mim a aptidão natural para tal nunca serei um Mozart da felicidade. Sendo uma falha genética só me resta esperar que os novos avanços na terapia génica e no genoma humano descubram uma maldita forma de inserir em mim o gene da felicidade.

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