terça-feira, 16 de novembro de 2010

Até à próxima vez que nos virmos


Estou tão feliz por te encontrar de novo! Caramba, parece que foi ontem mesmo que nos vimos e já passaram anos. Já te disse que penso em ti muitas vezes? Que penso nas coisas que fizemos juntas, nos momentos que partilhámos? Às vezes começo a rir-me assim, do nada, e penso em ti. É como se o tempo não se tivesse interposto entre nós.

Há amigos assim. Conhecemo-los num momento em que o universo parece ter reunido todas as suas forças para propiciar o encontro. Um daqueles encontros casuais numa paragem do autocarro, num congresso, na fila para o quarto de banho. Começamos a conversar, primeiro quase a medo, não fosse eu o bicho-do-mato que sou, e de repente eis-nos ali a tagarelas como velhos amigos, como amigos de infância.

Depois vai cada um para seu lado, viver as suas vidas, namora e desamora, casa e descasa, sai de um emprego e vai para outro, tem filhos, fica mais velho, mas no dia em que nos encontramos novamente é como se tivesse estado juntos todos o este tempo. Não há silêncios, nem vergonhas, só muita coisa para contar. É como se a sua vida fosse um bocadinho minha, e as suas dores um pouquinho as minhas também.

Conheci a minha amiga Maria numa paragem de autocarro em Veneza. Vejo-a chegar ao longe, arrastando desesperadamente uma mala maior que o seu 1,60m, e pergunta-me naquele inglês macarrónica que desmascara logo um grego, se sabia para onde ia o autocarro. Depois de algumas respostas monossilábicas da minha parte lá chegámos à conclusão de que, afinal, íamos para o mesmo sítio, participar no mesmo evento. E ali mesmo, no meio da rua, começámos as duas aos pulinhos, a modos que descobrindo que assim como existe o amor à primeira vista também existe a amizade à primeira vista.
Durante o resto da semana eu e o meu meio-limão (foi assim que nos baptizámos) fomos inseparáveis. Talvez o facto de sermos as únicas latinas do grupo tenha contribuído para estreitar o laço, ou porque ambas as nossas vidas eram estranhas qb, ou talvez porque, simplesmente, it was meant to be.
Muitas lágrimas de despedida no aeroporto, muitas horas no msn, e passados uns meses eis que a minha Maria arranja forma de me convidar para um projecto, como modo de encobrir uma oportunidade de estarmos juntas.
Ora, não era aquela a melhor altura da minha existência. A bem dizer, tinha o coração partido, a vida feita em cacos e por dentro estava vazia de tudo. A Maria também não estava melhor. Pois que grega com juízo se lembra de arranjar um namorado turco? Bem sei que podia ter sido um contributo importante para a paz mundial mas, enfim… a coisa estava condenada ao insucesso. E lá estávamos as duas, algures numa cidadezinha irlandesa perdida no meio da terra de ninguém, com um tempo merdoso capaz de deprimir o mais optimista. E se há coisa que não esquecerei foi o dia em que ela me pediu para me deitar ao seu lado, olhos inchados pelas lágrimas, me agarrou na mão e disse, naquele inglês lindo que aprendi a adorar: “Estou tão feliz que estejas aqui agora, Que seria de mim se estivesse sozinha?”. Háverá coisas bonitas que os amigos dizem uns aos outros, mas esta…. Autch!!
E quando a história de amor entre a Grécia e a Turquia chegou ao final mais final que pode haver, e a Maria decidiu deitar fora toda e qualquer memória do “falecido emocional”, pegou num lindo par de sapatinhos violeta, de verniz, com um laço, como sapatos das princesas dos contos de fadas, e enviou-mos pelo correio. Sim, os benditos voaram da Irlanda para Portugal, como se fossem um órgão para transplante. Disse que eu era a única pessoa que ela gostaria que os usasse. E sempre que os calço – as cabeças que se viram para os ver! – me recordo do tudo porque passámos juntas, Porque aquele tudo já é muito: muitas lágrimas, muitas gargalhadas, mas muita esperança também.

Com a Maria Teresa a história repete-se: vi-a a primeira vez num congresso e não conseguia deixar de olhar para aquela mulher linda, fantástica, brilhante, a estrela da festa e só pensava no emocionante que deveria ser ter uma amiga assim.
Claro que vivendo ela noutro continente parecia difícil que a nossa amizade fosse para além de encontros casuais em congressos da especialidade, mas a vida tem destas coisas e acabámos por volta e meia “chocar” uma com a outra. E sabem de uma coisa? Cada vez que nos vemos é como se nunca nos tivéssemos separado.
As duas estendidas no sofá, a contar histórias, trocar sombras e batons, experimentar sapatos, como velhas amigas de infância. Nunca há silêncios. Parecemos gralhas. Invadimos tudo com a nossa energia. Os taxistas passam o tempo a olhar pelo espelho e a rir. Les enfants terribles, uma espécie de arrastão de hormonas femininas, de máquina em punho a querer fotografias com tudo e com todos, como se precisámos desesperadamente de mais memórias que sobrevivam até ao dia em que nos encontremos de novo.

Fui abençoada com a sorte de ter amigos (literalmente) em todos os continentes. Claro está que não os encontro ao virar da esquina e por vezes passam anos que não os abraço. Felizmente as novas tecnologias vieram permitir manter estas tele-amizades. Mas o surpreendente é que cada vez que nos encontramos é como se nunca nos tivéssemos separado. Nunca sei quando os verei de novo, ou sequer se os verei mais. Por isso aprecio tanto cada momento e nunca lhes digo verdadeiramente adeus, mas apenas que se cuidem até à próxima vez que nos virmos.

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