quarta-feira, 21 de abril de 2010
O escândalo “holydaygate”
Uma das desventuras (porventura até a única) de não ter namorado é a ausência de companhia para férias. Alguém que discuta connosco o local do destino, que compre os mapas e os remédios que nos esquecemos de comprar, que partilhe convosco a comida do avião e que possa aparecer nas nossas foto de recordação.
Para as mulheres sozinhas deste mundo – corrijo, independentes – restam, porém, algumas alternativas… cada uma mais sedutora do que a outra, digo já. Uma das possibilidades é partir sozinha, à conquista o mundo como Marco Polo conquistou a Ásia. Sem dúvida que a força premente das circunstâncias nos força a fazer muitos amigos e a reencontrarmo-nos com o verdadeiro eu, blabla, blabla, blabla, aquelas coisas do redescobrir-me a mim próprio, que aparecem nos livros de ioga e de meditação, e das quais prescindo, não apenas porque grande parte das viagens da minha vida foram apenas comigo mesma e só comigo, de modo que been there, done that; mas também porque creio que depois de 33 anos a viver comigo – e na maior parte dos anos só mesmo comigozinho - já conheço cada milímetro do meu corpo a ponto de nesta altura do campeonato estar preparada para conhecer novos milímetros nunca antes explorados, de outros corpos preferencialmente. Mas sobretudo porque eu gosto de companhia, especialmente nas férias. Gosto de ter alguém ao meu lado com quem partilhar um gelado, um amanhecer, uma paisagem de cortar o fôlego.
Se esta opção parece assim, à primeira vista, a mais aventureira, na verdade, bem mais temerária é a segunda: partir com uma companhia masculina que se enquadre nas categorias de amigo ou amigo colorido. É que neste cenário tudo pode acontecer. E quando digo tudo falo inclusive de homicídios violentos. Na vida normal e tranquila do dia-a-dia os nossos amigos podem parecer gente normal, amigalhaços com quem partilhar tudo, inclusive um pouco mais que tudo, mas em período de férias aquelas hormonas transmutam-se e não são as poucas as histórias de meninas que se vêm a braços com um apaixonado desconhecido e indesejado. Recordo sem nostalgia a única vez em que ponderei seriamente umas férias desta índole, no caso, em Marrocos, com um suposto grupo de amigos do meu amigo (completamente a preto e branco, que eu não sou dada a pintar livros de colorir com amiguinhos) de número indefinido, mas tudo gente simpática, segundo ele em assegurou. Por uma curiosidade miraculosa uma par de semanas antes da coisa se dar quis saber mais detalhes sobre o tal suposto grupo, e vim a saber que afinal já estávamos reduzidos a quatro: eu, ele e um casal de namorados. Ora, quando eu já debatia para com os meus botões como se faria a distribuição de quartos (preciso de fazer um desenho???) o cavalheiro facilita-me a coisa. É que porventura atento à mudança de tom da minha voz, denotando alguma hesitação, tentou convencer-me com imagens idílicas das nossas férias: no meio do deserto, ao por do sol, a beber um chá. Mas não ponderou o discurso a saiu-lhe da boca um “neste cenário ainda te apaixonas por mim”. E “prontos”, subitamente a minha tia-avó adoeceu e eu, com muita, muita, muita, pena minha já não pude acompanhá-lo.
Finalmente, a terceira opção da mulher sem attachments é mesmo ir com as amigas. Até aqui tudo bem. Parecem as férias ideais. Isto não fosse o facto de eu ter alguma dificuldade em passar muito tempo (leia-se, dias) só com mulherio. Já para não falar dos casos em que as amigas passam as férias banhadas em mojitos e margueritas, de modo que nos vemos na posição de baby-sitter de mulheres feitas, ou se embeiçam por alguém, deixando-nos à nossa sorte, ou, pior ainda, se embeiçam por alguém e contam com o nosso apoio solidário para entreter algum amigo do dito.
Sempre pensei que os namorados nos livrariam destes dilemas existencais. Qual não é o meu espanto ao descobrir que hoje em dia estão na moda as férias a solo: ele com quem lhe der na gana e nos com quem a sorte (ou o azar) nos coloque no caminho. Quero começar por dizer que não tenha nada contra os casais que optam por este tipo de arranjo, por ser aquele que melhor se coaduna à respectiva relação e às personalidades de cada um deles. Vive e deixa viver, sempre disse. Mas, muito sinceramente, esta não é a minha onda.
Eu quero alguém na minha vida para partilhar o bom, o mau e o assim-assim. Os dias rotineiros de trabalho imenso, os fins-de-semana de alguma tranquilidade e as férias de loucura. Senão vejamos: durante todo o ano, seria eu a aturar-lhe os problemas (de trabalho, com os irmãos, com os amigos) e as crises existenciais, a cuidar-lhe da roupa e da comida, em suma, a levar com um tipo carrancudo, cansado e impaciente. Eis que chegam as férias e o senhor pega nos amigos, e naquela parte de si mais descontraída, divertida e sexy, e parte com eles? E eu? Bem, não se preocupem comigo, porque a mim sempre me resta uma daquelas fabulosas três hipóteses. Depois alguns admiram-se de terem que entrar no avião de regresso baixando um pouco mais a cabeça…
Segundo esta lógica, e já agora, porque não temos quartos separados? Ou melhor ainda, vivemos em casas separadas. Em bom rigor, nem precisávamos de nos encontrar para outra coisa que não fosse a procriação, e isto apenas enquanto não puder ser feita à distância, eu numa capital europeia com companhia indefinida, ele no resort com os amigos e umas cervejas.
Um namorado deste tipo será sem dúvida perfeito para muitas mulheres neste mundo. Aquelas de nós mais individualistas, que não suportam a mesma companhia durante muito tempo. É, sem dúvida, perfeito para quem queira aproveitar as férias para experimentar, digamos assim, algo novo. Simplesmente, eu não sou uma mulher dessas. Eu sou uma daquelas que procura um companheiro para a vida, alguém com quem construir alguma coisa que perdure, que me faça sentir segura e desejada, em suma, que não sinta necessidade de estar sem mim. O conceito de “férias da relação” só tem sentido quando a relação se tornou numa imposição ou num mal menor. Não é que as relações arrastem consigo um compromisso de passar férias juntos, como se fosse uma espécie de dever jurídico, que temos que cumprir, ainda que contrafeitos. Para isso prefiro férias sozinha e, já agora, uma vida sozinha. Mas se a nossa cara-metade não sente a necessidade de passar férias connosco, de ter a nossa companhia, especialmente naqueles momentos nos quais, supostamente, estamos mais felizes, então, é porque falta aquela coisinha especial a que se tem vindo a chamar amor. Para outras pessoas esta necessidade não é essencial, pode revelar-se dispensável e mesmo evitável. Para mim, não concebo coisa diferente. De forma que aquele que fizer as malas e partir sem mim nunca será a minha laranja. Na melhor das hipóteses será a minha meia-banana, mole e prestes a apodrecer.
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