quarta-feira, 14 de abril de 2010

A Falsa Magra


Todos nós que temos amigas magricelas já passámos por este pequeno drama de corredor: avistamos a amiga ao longe, radiosa e cheirosa, e, mais do que isso, não gordurosa. Pavoneia-se por entre os móveis com o seu pequeno rabinho de coelho, e ri-se para nós com aquela alegria que só conseguem ter as pessoas que agarram as calorias pelos tomates e as mandam dar uma volta. Nós, na ingenuidade que quem gostava de ter tão pouca carne agarrada aos ossos, e embevecidas com aquela mistura agri-doce de ciúme e admiração, entornamos a cabeça para o lado e murmuramos em tom sibilado: “Ai que inveja, és tão magrinha”. E vai, lança-nos um olhar condescendente, olha-nos de alto a baixo para nos tirar as medidas e dá a resposta. Sim, a tal resposta. Ai o que eu odeio esta resposta: “Não digas isso. Sou uma falsa magra”.
Silêncio, que estou a respirar fundo….
Antes de mais, ó minha menina, que raio é isso da falsa-magra? Queres-me tu dizer que na verdade és uma balofa, a lançar gosma pelos poros, mas que de manhã ao acordar te apertas num espartilho digno de uma Scarlett O’Hara e passas assim o dia, respirando utilizando apenas a 10% da amplitude toráxica? É isso que me estás a dizer caramela?
Eis aqui o que eu não entendo: Toda a gente quer ser magra. Mas depois ninguém admite que o é. Eu quase como ser racista. Estamos rodeados deles, mas quase nenhum os tem suficientemente no sítio para admitir que o é.
Tudo bem que anda por aí muito embrulho que esconde peças estranhas lá dentro. Quantas vezes não admirámos uma barriguinha bem tonificada no ginásio para depois chegar aos balneários, a senhora começar a strip-tease que antecipa a abanar, e damos de caras com um daqueles rabos gordos, cheios de celulite, a abanar por todos o lado? Uma visão apocalíptica que poucas de nós irão esquecer.
Mas a verdade é que as nossas amigas não são assim. São lindas, esculturais e sem peles pendentes. E felizmente têm o bom senso de não se colocar ao nosso lado em frente ao espelho do quarto de banho (ou já não sorririam com os dentinhos todos).
A verdade é que a maior parte de nós, euzinha incluída, temos alguma dificuldade em apontar aos outros as suas falhas mais evidentes. Somos capazes de lhes atirar á cara defeitos rebuscadíssimos, mas aquelas coisas que saltam à vista teimamos em ignorar. Eu própria quase criei uma vez uma tese científica demonstrativa que a minha amiga redonda tinha praticamente a minha fisionomia. É bem certo que eu me poderia esconder dentro dela e nunca ninguém me encontraria. Mas como lhe dizer isto? Aliás, como concordar com ela quando me disse isto? “Sim, tens razão, és enorme, uma bola de sebo!”. Dizem por aí que eu digo sempre o que penso, mas asseguro-vos que não é verdade. Há momentos na vida em que sou a maior hipócrita desta parte do hemisfério. Este foi um deles. De modo que lhe disse: “Que disparate. Somos quase iguais, eu e tu.”. Por outras palavras, o engodo da “falsa-magra”.
Bem sei que raramente achamos que estamos magras. Em certo momento da minha vida tinha as costelas a romper pelas costas e ainda assim considerava-me um Demis Russos de vestido. Mas isso foi quando vivia em guerra aberta com a balança e achava que nunca se é suficientemente magra. Hoje em dia assinámos um acordo d e paz (que mais não seja temporário), de modo que tento conviver com os meus centímetros a mais e com a minha tonificação a menos.
Até porque agora, pelo menos, consigo olhar para o chão e não ver os pés, dado ter algum volume na parte superior dianteira. Sim, fico em êxtase de perder 10gr, mas como em regra as perco no enchimento do soutien este deslumbramento é sistematicamente acompanhado de alguma desânimo ao ver o meu decote. Lá está… não se pode ter tudo da vida. A não ser que sejamos a Giselle. Mas ainda hoje estou em crer que se trata de algum produto transgénico a querer fazer-se passar por mera mortal.
E prometo que da próxima vez que subir para a balança e a malvada me deitar a língua de fora, lanço-lhe o meu olhar mais destemido e respondo-lhe com audácia: “O que foi? Sou uma falsa-gorda?”

2 comentários:

  1. Pois eu cá considero-me um verdadeiro cepo. engordei imenso e não consigo deixar de comer. e já ninguém me nega isso, pois em vez de me dizerem "não tas nada" já passaram ao "e eu? ves como TAMBÈM estou enorme???". coisas destas. Num minuto decido abandonar todo e qualquer tipo de hábito alimentar, mas no segundo seguinte alambazo-me com um pacote de bolachas de chocolate. Whatever. Acomodei-me? talvez. não me interessa. O meu pai não criou uma filha para a ver passar fome.
    lembro-me de ti magrinha, magrinha. Garantidamente, estás milhoes de vezes melhor agora. as gajas querem-se carnudas. Palitos só de madeira, enfiados em rissois, e nas batatas fritas. nham nham

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  2. Recordas-te de mim? Hum… caríssima, nós conhecemo-nos? Fomos coleguinhas?

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