quinta-feira, 8 de abril de 2010

Coimbra, o encanto da despedida


A primeira cidade onde vivi sozinha foi Coimbra, e talvez por isso a coisa mais natural de suceder seria tê-la adoptado como minha. O nosso lar não é necessariamente onde nascemos, mas onde nos sentimos bem. Já isso explica porque nunca foi Coimbra o meu lar.
Coimbra é para mim como aquelas pessoas que nunca nos fizeram mal algum, mas com as quais nunca tivemos empatia. Suporta-las, umas vezes com mais entusiasmo do que outras, mas definitivamente não nos reconhecemos nelas. Também assim os meus anos em Coimbra foram uns melhores do que outros, mas nunca me senti em casa.
Porque permanece tanto tempo? Vicissitudes, diriam os políticos. Uma amarra, digo eu. Ou melhor várias, que variaram ao longo dos anos. Quando cheguei, em 94, a ambição da licenciatura em Coimbra, o desafio de saber se era suficientemente boa para a terminar com algum brio. Recordemos que nessa altura direito em Coimbra causava esgotamentos, depressões e muitos egos partidos. Mas já então essa fúria de viver mais depressa do que o doce ritmo do Arco de Almedina que impelira a sair. Os melhores seis meses da minha vida, diria eu: 6 meses em Roma, sem obrigações nem attachments.
Recordo- me que logo que regressei, na minha primeira noite depois de meses de ausência, esbarrei com a Estudantina, e dei por mim de lágrima no olho. Claro que nada comparado com o pranto das noites académicas no parque (na altura, ainda do outro lado da ponte) no ano em que fui quintanista. Lembro-me de ver a Pitagórica, com os seus autoclismos e as suas sanitas. Mas depois… depois veio a Balada da Despedida, e lembro-me perfeitamente de pensar que aquilo era o fim de uma era na minha vida. Só quem por lá passou de capa negra percebe o que estou a dizer.
Depois, uma paixão imensa pelo trabalho académico. Quando eu me preparava para enfiar uma mochila às costas e conhecer o mundo, já com um título no bolso, surge a oportunidade de ter aquilo que eu achava ser a melhor profissão do mundo: estudar. E ser paga para isso! Sei que as pessoas normais se apaixonam por seres humanos, mas eu tendo a apaixonar-me por trabalhos. E aquele foi um motivo ponderoso para ficar durante mais um par de anos. E quando a urticária das viagens, dos sonhos, da curiosidade por esse mundo lá fora começou a sufocar-me fiz as malas e parti.
Na verdade a tranquilidade e monotonia da vida na pequena cidade foi sendo interrompida ao longo dos anos com diversas escapadelas, umas de dias, outras de meses, outras ainda de anos. Da última vez que regressei a vida naquele cantinho torna-se um pouco mais insuportável. Ainda assim… porque terei ficado? Amarras pessoais.
Há quem não parta porque não tem para onde ir. Eu sempre tive tantos sítios para onde ir, especialmente aqueles onde nunca fui. Não parti porque tinha demasiados motivos para ficar. Quando todos eles desapareceram e só ficaram motivos para sair, então, fiz as malas e saí de vez.
Continuo a ir regularmente a Coimbra. O meu trabalho ainda é lá. E, de certa forma, grande parte da minha vida está lá presa. Os amigos mais próximos ainda lá estão. A maior parte das recordações da minha vida reporta-se a essa cidade. Fui feliz em Coimbra algumas vezes. Mas, acima de tudo, fui tremendamente infeliz. A verdade é que eu e esta cidade ainda temos algumas questões pendentes, que espero um dia resolver.
Como disse, viajo regularmente para Coimbra, e tento restringir-me ao percurso bastante limitado que liga a estação de comboios à universidade. Desenvolvo esforços imenso para evitar pernoitar. E, mais uma vez, quando sou forçada a faze-lo, tento passar o dia quase todo na universidade e chegar a casa à noitinha, pronta para ir dormir cedo, ansiosa por partir na manhã seguinte. Numa mais tive uma saída social em Coimbra. Evitei-as a todo o custo e agora apareceu-me como uma inevitabilidade. O que ira acontecer? Quem irei encontrar? Mais: como irei encontrar a cidade? E como irá ela encontrar-me a mim, que estou diferente, uma Vera tão diferente daquilo que um dia fui?
Diz o poeta que Coimbra tem mais encanto na hora da despedida. Verdade seja dita que para mim nunca teve muito encanto. Mas reconheço que sempre que partia sentia uma lágrima teimosa a escorrer-me pela face. Nunca mais a senti.

3 comentários:

  1. Olha, comigo foi ao contrário. cheguei há 15 anos, e gostei tanto que nunca mais fui embora, nem mesmo quando tinha todos os motivos e mais alguns para isso. continuo a dizer que devia mesmo ir. mas não vou, talvez um dia consiga. e amaldiçoo o dia em que me afastei de coimbra e fui para montemor, porque nunca devia ter feito isso. agora que vou voltando aos poucos, é um alivio. A minha terra é linda, a minha 2ª terra é de muitas oportunidades, e coimbra... é uma constante. estão aqui algumas das melhores pessoas que conheci (algumas das piores tb). Não tenho irmãos, e ganhei 2 ou 3 aqui. Como poderia deixá-los??? :)

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  2. Como te compreendo! Curiosamente depois de ter deixado coimbra por uns tempos senti uma falta tremenda e uma saudade tão arrebatadora que achei que não conseguiria viver sem estar ligado a coimbra. Agora que trabalho cá tenho uma dificuldade tremenda em ter saídas sociais em coimbra e acho que chego mesmo a evitá-las! É uma espécie de repulsa irracional que espero um dia compreender... até porque tudo indicaria o contrário, uma vez que ainda tenho por cá grandes amigos. Mas não há nada que me faça ficar até mais tarde, para uma fresquinha na Praça ou um simples café! Coisas...

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  3. :) Só posso dizer que já chorei só de rever a Cabra, que fico embevecida quando o Baptista se põe a fotografar a malta nas escadas da nossa Via Latina, que nos dias de orais de Setembro me apetece largar tudo e também ir praxar, que a balada do 5.º ano jurídico ainda me arrepia e que já podia ter ido embora, pois podia, mas até hoje sempre escolhi ficar!
    Beijos, miúda!

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