sexta-feira, 23 de abril de 2010

O dia em que o mundo acabar


Já tinha ouvido dizer que o mundo ia acabar um dia destes. Depois, aproveitei aquele fugidio serão de Domingo para ver um tal “2012” (não, não recomendo). Finalmente, decidi confirmar as minhas suspeitas com uma pesquisa. E sim, certifico que o mundo vai acabar mesmo dia 21 de Dezembro de 2012.
Se porventura tal não suceder não me venham pedir contas a mim, que eu limito-me a citar o que li na fonte de infirmação mais fidedigna do mundo: a internet. Se querem exigir uma explicação a alguém, ou uma indemnização caso a coisa não se dê, é favor dirigirem-se aos Maias, que esta profecia é deles. O dado curioso da história é que foi depois plagiada por diversas outras profecias, desde um tal livro chinês sobre filosofias e concepções, até ao mago Merlin, passando pelo Nostradamus. Enfim, se alguém tiver mais curiosidade do que o teor normal de estranheza despertado por uma sentença de morte a pairar sobre o planeta, faça o favor de consultar http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=21960&op=all ou http://www.fimdomundo2012.com/, e a partir daqui poderão acreditar ou desacreditar, conforme assim o entendam.
A questão é que se o mundo terminar mesmo em 2012 tenho que repensar a minha vida. Desde logo, será que faz sentido continuar a evitar chocolates e bolas de Berlim? Ou seja, se o mundo vai acabar em breve provavelmente o pouco tempo me resta não será suficiente para eu me assemelhar a um texugo. E, mesmo que o seja, mesmo que eu me torne a Miss Piggy, não será que de qualquer não viverei assim tanto para ficar angustiada?
Basicamente, a minha questão é esta: tivesse eu absoluta certeza que o mundo vai terminar, que faria? Será que me desleixava e me deixava mergulhar na imensidão da preguiça, aproveitando cada sesta, casa não ida ao ginásio, cada bolacha? Ou, pelo contrária, investia ainda mais em mim de forma a deixar um cadáver bonito? Bem, como o anunciado fim do mundo não parece deixar algum cadáver minimamente reconhecível a primeira hipótese ganha peso (o que não deixa de ser uma imagem bastante adequada à situação).
Será que faz sequer sentido terminar a tese, e continuar a passar dias e noites fechada em casa? Provavelmente o melhor é carpir o dia, carpem diem, como quem diz, soltar a franga, mergulhar na prostituta da loucura (achei que era um sinónimo mais polido para o vulgo “puta da loucura”). Mas, por outro lado, depois de tanto tempo, anos mesmo, a investir neste escrito de profundíssima sabedoria, desistir seria morrer na praia, que é sem dúvida um desânimo porque nos arriscamos a que uma gaivota mais atrevida nos faça cocó no cadáver bronzeado. Em suma, deixa-me cá agarrar ás teclas e assim ao menos morro “senhor Doutora”.
Será que vale a pena informar os meus ódiozinhos de estimação do quanto me incomodam? Não o saberão eles já? Que ganham com isso? Ou melhor, que ganho eu com isso? Morrerei mais leve? Ou mais pesada?
Já dizer àqueles de quem gosto o quanto os amo, a falta que me fazem, o importante que foram na minha vida, isso parece-me bem mais relevante. Quantas vezes nos esquecemos de o fazer? Acho que damos estas coisas como dado adquirido e supomos que os outros também. Para que vamos dizer ao pai e à mãe que gostamos deles, se eles já o sabem? E à avó? E àquele amigo que nos atende o telefone a qualquer hora? A verdade é que, mesmo que o saibam (e se passámos tantos anos ainda o desconhecem é porque alguma coisa se passa com a forma como manifestamos sentimentos) ouvir dizer estas palavras funciona sempre como certificação, inspiração e reconhecimento. Bem sei que os gestos valem mais do que as palavras, que o decisivo é a forma como tratamos as pessoas e não aquilo que lhes dizemos, porque, afinal, as palavras são mais facilmente manobráveis do que os gestos e as atitudes. Mas, ainda assim, não sabe bem ouvir dizer o quanto somos amados e o quanto precisam de nós? Já imaginaram o que será morrer assim de repente, caindo fulminados no chão, deixando tanta coisa por dizer? Deixando cá alguém a pensar que tinha apenas uma importância relativa na nossa vida quando, afinal, era o centro da nossa existência, o sol e as estrelas do nosso mundo? É curioso como a língua está sempre pronta para criticar e deitar abaixo, mas se torna tão preguiçosa no momento de dizer coisas bonitas. Num mundo perfeito todos diríamos àqueles que nos são próximos o quanto gostamos deles logo pela amanhã, certificando cada dia a sua extrema relevância.
“Bom dia, já te disse hoje que gosto muito de ti?”

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