quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Preciso que precises de mim


Desde que sou pequenina que quando estou doente o que mais quero é ter a minha mãe ao pé de mim. Ainda que seja para não fazer nada. Só mesmo para estar ali.
Quando há muitos anos atrás a minha vida sofre um revés daqueles que nos fazem questionar tudo o que existe só sobrevivi porque uma amiga se mudou de armas e bagagens lá para casa e cuidou de mim como se eu fosse a irmã que ela não tinha. Coisas que nunca esquecerei, imagens que ficaram para sempre marcadas da minha memória e que não conto aqui por algum pudor.
Há pouco tempo voltei a passar por uma tragédia pessoal e, mais uma vez, me vi na contingência de ligar aos amigos mais próximos, que chegaram ao ritmo dos segundos para me tirar dali e me pôr a salvo. E perante a imensidão da minha tristeza pedi a uma amiga, daquelas que sempre nos acompanham, para me fazer companhia nessa noite. Precisava que ela estivesse ali.
Esta é, no geral, uma característica das mulheres. Umas mais, outras menos, nenhuma de nós se inibe de emitir um SOS para uma amiga ou, quando estamos apaixonadas, para o Ele. É por isso que gostamos de vos contar todos os pormenores do nosso melodrama, para depois chorar no vosso ombro. E ficamos ali, só por sim.
No meu caso particular, o facto de ter sido tão mimada ao longo da minha vida pode explicar esta necessidade de nas situações limite ter outro coração a bater junto ao meu. Habitei-te desde cedo a ter ali alguém – o pai, a mãe, a prima, um amigo – e apesar de a idade me ter tornado mais individualista, mais forte, ter endurecido a minha casca, ainda hoje não me envergonho de estender a mão e pedir uma presença.
Por isso mesmo tenho alguma dificuldade em compreender porque é que vocês não o fazem. Vocês, os homens. Ai, os homens. Não importa que estejam nas urgências do hospital a contorcer-se de dores ou em casa a arder em febre, não importa que tenham perdido alguém que lhes é muito querido, ou sofrido um grande desgosto, ou tido um revés no trabalho, ou mesmo perdido o emprego, ou caído da mota, não importa que o vosso mundo acabe mas, basicamente, nunca precisam de ninguém. Não percebem que essa não é a vossa força, mas sim a vossa fraqueza?
Será que no dia em que vos ensinaram que um homem não chora também vos disseram que um homem aguenta tudo sozinho? Um homem chora, e não apenas quando entala a pilinha no fecho das calças. Chora quando perde alguém ou está na eminência de perder. Chora quando lhe magoam o coração. Vou assumir que, ao contrário de nós, não chora porque já não há sapatos do seu número. Mas depois soluça que nem um bebé quando a sua equipa perde a taça. So what?
Ah, raça malvada!
Recordo-me da minha prima teenager ter no quarto uma pedra que ela própria pintara à mão, e onde desenhara artisticamente uma frase. “Nenhum homem é uma ilha”. Escusado será dizer que aos olhos dos meus 8 ou 9 anos aquela afirmação era indecifrável. Talvez pelo seu mistério nunca a esqueci e revejo agora a pedra na minha cabeça, com todos os seus pormenores. Nenhum ser humano é uma ilha. Não o são as mulheres, apesar de os poetas gostarem de retratar o nosso corpo como tal. Não o são os homens. Todos precisamos daqueles que mais gostamos. E esses que mais gostamos, e que também mais gostam de nós, precisam que precisemos deles. Porque aquela voz ao telefone que nos diz “Vem até cá, por favor, preciso de estar contigo”, diz muito mais do que isso na verdade. Diz-nos que nos tem como uma pessoa especial, em que confia, que a nossa mera presença é suficiente para o tranquilizar. Precisar é amar.

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