domingo, 27 de março de 2011

Toda a felicidade que houver no mundo


Desejo-te o melhor. Toda a felicidade que houver que no mundo. O que desejo para mim desejo para ti também.
Que encontres a tua meia-laranja, quer fiques com ela ou a deites fora.
Que sejas o que sempre sonhaste.
Cheguei a convencer-me que eu faria parte desse sonho, mas as pessoas convencem-se de coisas tão tolas que quase se pensaria que tolas são as pessoas.
A verdade é que a felicidade é um bem escasso, como diriam os economistas. Um pouco como a manteiga em tempo de guerra. Nós somos muitos e a felicidade é pouca. E como se a sua escassez não bastasse ainda por cima é distribuída de forma bem pouco equitativa. Serão os ricos mais felizes? Os idiotas? Os génios? Os magros? Os gordos? Os casados? Os solteiros? Os mesquinhos? Os bonzinhos? Será que a felicidade é um gene do nosso ADN? Visitei muitas bibliotecas e muitos sites mas ainda não descobri o critério que faz com que algumas pessoas desejem levantar-se na cama para poder viver mais um dia e outras só o façam porque assim têm menos um dia para viver. Nem sequer me parece credível a velha teoria do Karma e do Dharma. Porque assim de repente consigo enunciar umas cem pessoas que são tão linda por dentro quanto infelizes por fora.
Eu, para mim, já nem quero toda a felicidade que houver no mundo. Quero apenas um bocadinho, não vá ter uma overdose de felicidade e acabar por morrer feliz. O que seria o cúmulo da ironia: um tipo é finalmente feliz e no instante seguinte morre.
A verdade é que talvez eu já tenha esgotado a quota de felicidade que me coube. É bem capaz desta questão ser regulada nos mesmos termos das relações internacionais, ou seja, tal como se distribuem pelos Estados quotas de poluição, Vai dai, eu já devo atingido o meu limite. É que quando olho para mim - para nós - nas fotografias, sei que naquele instante em que a câmara disparou eu era tão, mas tão feliz, que provavelmente já fui o mais feliz que alguém pode ter sido. Aquela era mesmo eu. Não era uma actriz, nem um desenho animado. Era eu feliz.
Ainda assim, ando a ver se encontro pelo menos uns gramas de felicidade. Talvez no mercado negro consiga pagar por ela um preço não muito elevado. Porque nos supermercados e locais de comércio habitais já há muito se esgotou. Foi levada por todos os primos e primas, amigos e amigas, que à noite chegam a uma casa quentinha e cheia de gente.
Muito me admita que o Continente não tenha pendurado nas suas prateleiras um aviso do género: “Prezado clientes, atendendo ao drástico decréscimo de felicidade a nível mundial teremos que racionar a sua aquisição, de modo que cada pessoa só poderá levar consigo um pacote. Gratos pela atenção, pedimos desculpa pelo incómodo”.
A questão é que quando isto acontece vamos reclamar com quem? Tenho para mim que o senhor Belmiro tem muito pouco a ver com a miséria das nossas vidas. Se ao menos fosse católica sempre poderia reclamar Com Deus. Talvez passar pelo Céu e escrever no Livro de Reclamações, como é meu hábito. Mas – como já se previa – não tenho a felicidade de ser possuída por uma fé no divino, de modo que mais não me resta senão reclamar comigo própria.
Porque a verdade é esta mesma: a religião, seja ela qual for, tem ao menos o grande mérito de nos permitir culpar alguém pelas nossas mágoas e frustrações. São os desígnios divinos. Tudo corre mal, mas não baixamos braços porque, afinal, Deus providenciará. E como Ele trata de tudo podemos nós viver mais descansadamente a nossa miserável vida. Já eu, que sou agnóstica, não posso apontar –Lhe o dedo. A minha fé resume-se a mim mesma, de modo que sou eu quem tem que providenciar por dias melhores ou bem posso chafurdar na tristeza.
Mas isto, tudo isto, são meras reflexões colaterais a propósito da felicidade. Aquela que te desejo a ti. Quero encontra-la, embrulhá-la e dar-ta de presente. Toda a felicidade que houver no mundo, mesmo que assim eu fique sem nenhuma para mim.

1 comentário:

  1. A felicidade é distraída, para nos cruzarmos com ela também temos que o ser. Todos os dias ando desatenta, ao ponto de bater em postes a caminhar… e todos os dias me cruzo com a felicidade, mesmo que por escassos minutos. A felicidade surge per si.

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