quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Jogos de lealdades


Certamente já vos aconteceu. Um dia, assim do nada, são abordadas por uma perfeita desconhecida no café, no Facebook, no mail, por telefone, que vos diz qualquer coisa do tipo: “Olá, tu não me conheces. Sou a Y, e sou, bem… assim uma espécie de namorada do X. Sei que vocês são amigos e preciso de te fazer umas perguntas”.
Esta “espécie de namorado” – nome vulgarmente dado à miúda com quem se enrolam, mas que não assumem em privado e muito menos em público – quer, basicamente, decifrar a vida de alguém, e crê que nós podemos funcionar como chave descodificadora.
Nesse mesmo instante somos confrontadas com os nossos instintos mais básicos de lealdade. De um lado temos o X (vamos chamar-lhe assim), que oscila algures entre um conhecido simpático, o melhor amigo do nosso namorado ou mesmo o nosso melhor amigo. Do outro lado temos uma fulana que nos é completamente estranha, mas que o destino colocou naquela situação onde um dia já estivemos ou onde tememos vir a estar.
Note-se que no meu enredo o “engandor” é um menino e a “enganada” é uma menina. Admito que nem sempre assim seja e que os papéis se possam inverter. Certamente há por aí resmas de gajas a vangloriar-se de ser médicas quando não passam de empregadas de Zara, ou, puxando um bocado mais a fantasia, a fazer-se passar por agentes secretos ou membros do Conselho do Estado (por favor, não esbocem um sorriso irónico a pensar que estou a atirar para o ar exemplos extremos porque o relato de hoje baseia-se em factos reais), ou fingir ser moçoilas solteiras e desimpedidas quando já são mães de 3 filhos. Certa mente que tudo isso acontece. Simplesmente, nada disso me aconteceu a mim. Nunca nenhum cavalheiro desgostoso e enganado me procurou para saber a dura verdade acerca de uma amiga ou conhecida que se tenha feito passar por quem na realidade não é.
Já o inverso… meus amigos, colecciono histórias. Não sei se por ter tantos amigos meninos, ou porque este blog passa a imagem de uma guerreira que lidera as hostes femininas, a verdade é que já não é a primeira vez que me vejo confrontada com uma senhora em busca da vida secreta de um senhor.
E assim temos duas lealdades em confronto neste ringue que é a minha cabeça-
No canto esquerdo do ringue tenho alguém a quem devo, pelo menos, um mínimo de lealdade. Porque faz parte do meu círculo de amigos, ou pelo menos de conhecidos de quem tenho boa impressão. Ou, na pior das hipóteses, porque o meu mais-que-tudo me matava se lha traísse o amiguinho. Do lado direito do ringue aparece-me uma miúda que não conheço, mas que me apresenta um drama que conheço bastante bem. Não sinto que lhe deva nada em particular pelo facto de partilharmos ambas um par de cromossomas X’s. Esta coisa da solidariedade feminina, para mim, pára no limite onde a minha amizade chega. Quer isto dizer que a devoção e fidelidade que tenho para com as “minhas meninas” não se estende, nem pouco mais ou menos, a todas as mulheres do planeta. Aliás, é exactamente a mesma devoção e fidelidade que nutro para com os “meus meninos”. Para mim o critério sempre foi o da amizade, da convivência, do carinho e do companheirismo, e não se deixa poluir por supostas afinidades femininas.
Mas, então, que raio me faz hesitar e não mandar estas desconhecidas dar uma volta? É que, de facto, o caalheiro do outro lado do ringue se portou mal, muito mal.
Acho o engano e a mentira uma filha da putice imensa, mais que suficiente para abolir alguém do meu coração. Quando é preciso inventar contos e fábulas sobre a nossa profissão, o nosso estado civil, as nossas idas e vindas, será que nós próprios não nos transformamos nesse momento numa grande e gigante mentira?
Mas, por outro lado (e vejam só como é tortuoso o meu pensamento), não creio que me caiba a mim levantar o véu. Não sou nenhum anjo vingador destinado a espalhar a verdade pelo mundo. Até porque, uma partezinha da minha cabeça medita igualmente sobre a história que me foi contada pela “ela” e faz-me recordar que não tenho motivo algum para duvidar dela mas, por outro lado, nada me assegura que seja verdade. Ou, pelo menos, toda a verdade, sem corantes nem conservante.
E ali fico, entre a espada e a parede, dividida entre as lealdades pelas quais me tento reger. A minha saída airosa tem sido, até à data, a de me escusar de intervir (em jeito de analogia jurídico-processual, com se fosse um juiz com interesse directo no caso), explicado à senhora que não me cabe a mim, sobretudo dada a posição que ocupo no enredo, contar tricas e laricas sobre o visado, dando a entender que o melhor que terá a fazer será confrontá-lo, olhá-lo nos olhos e, se for caso disso, terminar a conversa com uma joelhada nos tins tins.
E porque a situação assim o proporciona, até aproveito para deixar já um esclarecimento, que há muito se faz sentir, dados os reparos que me têm feito, porque ao que parece quando escrevo critico mais os masculinos que os femininos. Então, cá vai: não tenho nadinha de nada contra os homens. Pelo contrário, tenho tudo a favor. Desde logo, porque sou uma mulher heterossexual. Depois, confesso que até que tenho uma certa inveja de vocês que podem fazer xixi de pé e não ganham celulite nas coxas. Mas, precisamente porque sou uma mulher heterossexual, as minhas maiores razões de queixa são contra os senhores. É que nunca nenhuma miúda me deixou pendurada para uma saída, me traiu com terceiros, em suma, o meu coraçãozinho de “babe” nunca foi partido por mulher alguma. Já de vocês, ai, de vocês tenho histórias, e histórias, e histórias, tantas que podia escrever um blog sobre isso.

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