quinta-feira, 14 de outubro de 2010

As palavras que nunca me disseste


Sei que anda por aí um livro (que nunca li) com um título parecido com este, e sei também que nas sessões da tarde dos canais de televisão deste mundo passa por vezes o respectivo filme. E sei isto porque numa chuvosa tarde de sábado, numa outra dimensão em que vivi, tive a infeliz ideia de espreitar o dito filme enquanto limpava o pó da sala. Subitamente, dei por mim a chorar baba e ranho por uma história que hoje já não recordo, mas certamente põe em pranto as pedras da calçada.
A única memória que guardo do best-seller é mesmo o título e todas as coisas em que me faz pensar. Melhor dizendo, todas as palavras que me faz dizer.
Sempre tive o cuidado de dizer às pessoas o quanto gosto delas. Vivo aterrorizada com a ideia de um dia ser atropelada, me aparecer uma doença terrível ou cair no poço de uma mina e não lhes poder dizer quão especiais foram para mim. A vida é demasiado curta, dizem. Eu acho que é uma afirmação relativa. Pode até ser demasiado longa. Mas de facto, enquanto vivemos uma história de amor, parece mesmo demasiado curta. Não há tempo para todos os beijos que queríamos beijar nem para todos os abraços que queríamos abraçar. E como a qualquer momento um de nós pode desaparecer devemos reafirmar até à exaustação a importância que aquela pessoa tem para nós. E faço questão de o dizer a todo o momento, quase no limite do enjoo, só para o caso de amanhã não acordar.
E depois fico sempre à espera que me digam alguma coisa a mim. Que me chamem antes de eu me afastar. Que venham a correr atrás de mim e me segurem no braço. Que entrem por essa porta, que digam que me adoram e mudem a minha vida (“Entre por essa porta agora. E diga que me adora. Você tem meia hora. Pra mudar a minha vida”).
Uma palavra pode mudar as nossas vidas. Pode ser decisiva. Porque é que não o dizem? Porque o não sentem? Porque não se sabem expressar? (às vezes digo para mim que têm receio de o dizer, que não sabem como o fazer, que não lidam bem com os sentimentos... é difícil aceitar que os outros não sentem o mesmo que nós e criamos estas fantasias tolas).
Tenho muita dificuldade em comunicar com quem não se relaciona bem com as palavras, porque eu poderia falar durante horas, dias até. Tenho sempre coisas para dizer e, desculpem-me a arrogância, mas acho que até as digo com alguma lógica e claridade. Contam-se pelos dedos de uma mão as vezes na minha vida em que fiquei sem palavras, e nenhuma dessas situações foi no âmbito de uma discussão, de uma tentativa de reconciliação, de uma declaração de amor, ou de qualquer outra argumentação apaixonada.
Para mim, que falo tanto, com tantos sentidos e entoações, é complicado enfrentar alguém que se refugia no silêncio. Então eu espero. Calo-me e espero. Que ele diga alguma coisa. Que me tranquilize. Que me apazigúe os ânimos. Que me faça acreditar. Que me deixe a rebentar de raiva, nem que seja isso. Mas ele nada. Continua passivamente a fazer o seu café, e nem certa estou de que tenha compreendido toda aquela torrente de emoções que acabei de lhe deixar aos pés, quase como uma oferenda sagrada.
Nunca vos apeteceu abanar alguém para obter uma emoção, uma reacção, um grito que seja? Quase preferia que me mandasse embora de vez ao invés de me aprisionar nesta conversa de silêncios.
Como é possível haver pessoas que gritam ao mundo que amam (escrevem-no no Facebook, fazem declarações públicas ao microfone, ajoelham-se em restaurantes) e outras nem sequer o conseguem sussurrar ao ouvido?

Eu até consigo viver com as palavras que nunca me disseste. Não sei é se consigo viver com as palavras que nunca me dirás.

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