quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Fustigue-me, não tenho filhos


Eu sou daquelas que fica de olhos arregalados a olhar para bebés, que mantém longas conversas com putos de 4 anos e que se delicia com qualquer botinha de lã. Já sabem que eu sou uma bomba relógio em potência, pronta para explodir resmas de bebezinhos rechonchudos.
Mas por muito que me delicie com as criancinhas já não me delicio com os pais das ditas, nem com outros adultos competentes que as acompanhem. In other words, eu posso lamber a ponta dos dedos depois de comer um bolo mas não tenho que lamber o pasteleiro.
Cenário 1: fila do pão, longa e pachorrenta, como são as filas do pão num sábado de verão pela manhã quando parece que mais ninguém tem pressa de ir para a praia senão eu. Mas o azar é que o senhor à minha frente temuma criancinha ao colo. Vai daí a senhora do pão parou o atendimento para fazer gracinhas à criaturinha. E o papá, embevecido como todos os papás, agiu como se o seu rebento fosse assim… a 10 576.ª maravilha do mundo. De modo que ali ficámos um bom par de minutos, eu já a saltitar na havaiana, o puto com toneladas de ranhoca a sair-lhe pelo nariz enquanto o pai e a senhora do pão o adoravam como se ele fosse o deus menino. Ora, eu não sou propriamente um rei Herodes, gosto até mais de crianças do que o comum mortal. Mas há momentos para gostar e estar ali a goooooooosssstttttaaarrrr, e outros para uma festinha na cabeça e ala que se faz tarde;
Cenário dois: os amigos que nos visitam com os respectivos rebentos. Que são lindos, sim senhor. Muito espertos, pois então. Como não íamos nós gostar deles se são filhos daqueles amigos que carregamos cá dentro como bocadinhos de nós. Pois é, mas quando as criaturas desatam a correm pela casa, com as mãozinhas pegajosas de milhentos caramelos e porcarias que tal (e mais vá-se lá saber o quê) a tocar em tudo o que é cortinado e sofá, aí, já repenso os longos anos de amizade que tivemos… Cada um é livre de impor as regras na sua casa. Há gente que em nome da veia criativa dos homenzinhos e mulherezinhas do futuro lhes deixam desenhar nas paredes, partir molduras, enfim, pintar a manta. Mas quando vêm à minha toca, aqui, eu sou a rainha da macaca preta. E como não tenho filhos paridos por mim o meu grau de tolerância face a birras e guinchos é menor que o dos papás. É que eles não são carne da minha carne nem sangue do meu sangue. E, convenhamos, há coisas que só se toleram a quem transportámos dentro de nós durante 9 meses, de modo que não podemos esperar que o resto mundo ache uma graça que a criatura faça xixi no meio da sala;
Cenário três: noite linda, gente bonita, musica ambiente, um bom vinho… e no canto o puto que não pára do berrar. Uma pessoa trabalha e trabalha muito. Pois a única noite em que sai… à noite tem um daqueles gritos estridentes a entrar-lhe pelo tubo de Eustáquio. E os papás sem outra reacção que não orgulho, ali pasmados a olhar para o infante como se fosse uma bela ária a sair-lha da boca. É certo que as pessoas com filhos têm tanto direito de desfrutar da noite como eu tenho. Não podem é estragar-nos a noite a todos. Por conseguinte, das duas uma: ou arranjam uma babá, ou quando a criança começa a ter ataques de fúrias abandonam o edífico, just like Elvis.
Sublinho: a culpa não é das criancinhas. Mais digo: deixai vir a mim as criancinhas. Não deixai é vir os paizinhos.
Não há vacas sagradas. O que vale por dizer que se for preciso apontar o dedo a um puto, aponta-se. Quem disse que as crianças são o melhor do mundo nitidamente não conheceu algumas delas. E não me estou só a referir aos pequenos assassinos dos filmes do terror.
Eu não sou a pior pessoa do mundo por nem sempre ter paciência para crianças. Até gosto de bebés muito para além da fase de blastocisto. E se não os tenho não se deve a nenhum decisão pré-ordenada, nem a egoísmos ou outras prioridades, mas sim ao facto de o mundo andar escasso de príncipes encantados dispostos a procriar.
Mas mesmo que não quisesse ter filhos isso não me transformava numa cabra egoísta. Apenas numa pessoa que não queria ter filhos.
Por isso é sempre com algum espanto que noto os olhares indignados quando eu explico que (ainda) não tenho filhos, os olhares de lado quando olho para o lado perante uma mudança de fralda, o tom acusatório quando reviro os olhos às birras. Pronto. Fustiguem-me… não tenho filhos!
PS- quando daqui a uns anos eu andar com uma criancinha agarrada do pescoço, a mostrá-la ao mundo como se ela fosse um misto de Gisele Bündche e de Marie Curie, mostrem-me este texto por favor. É que eu vou ser a pior mamã do mundo: a mais tolerante, mais transigente, mais boba, mais aduladora dos feitos do seu rebento, mais chata a impor ao mundo as gracinhas da criaturinha. Ora, eu não quero ficar embevecida com qualquer cocó da criatura como se nunca antes dela uma criancinha tivesse defecado. Portanto, nessa altura, fustiguem-me também.

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