domingo, 6 de maio de 2012

Desesperadamente procurando um palácio

Suponho que se eu fosse uma lagarta seria coisa complicada ter que procurar uma maçã bem vermelha e saborosa para viver, assim como se fosse uma bactéria seria complicado encontrar o intestino perfeito onde me aconchegar. Sendo eu uma Cinderela, encontrar um palácio está a revelar-se uma batalha ingrata. Atrevo-me até a assumir publicamente que preferia ter prisão de ventre durante uma semana do que meter-me nisto. Durante um dia, vá lá. Depois de muitos sites e de muitos telefonemas concluo o seguinte: encontrar uma casa é tão complicado como encontrar um homem. E note-se que eu não peço muito. Nas casas, entenda-se. Há muito desisti de closets para arrumar todos os meus sapatinhos, cozinhas equipadas com electrodomésticos de última geração, deslumbrantes vistas sob o rio. Ou melhor, há muito que a minha miserável conta bancária desistiu de almejar coisas destas. Eu só quero uma casinha onde me sinta bem, onde possa descansar os meus presuntinhos inchados depois de dias a galgar calçadas por essa cidade acima. Um sítio que forneça um abrigo seguro aos sapatinhos, aos casacos, às malas e aos livros. Onde os vizinhos não toquem bateria às duas da manhã e as vizinhas não sejam mais giras do que eu. Ora isto, meus amigos, não é fácil. Desde logo, não é fácil perceber os senhores das imobiliárias. Inauguro as minhas reflexões sobre este tema com a seguinte pergunta: porque raio dizem que vão ligar de seguida se não o tencionam fazer? Não me bastava passar por dramas destes com os tipos com quem janto e bebo café, agora ainda tenho que esperar ansiosamente pela chamada do senhor da imobiliária? É a subversão do mundo tal como o conhecemos. Depois, a questão da visita propriamente dita. E neste ponto confesso que bem gostaria eu de transpor o modelo de avaliação de apartamentos e garagens para as relações humanas. Como seriamos todos felizes se antes de entrarmos numa relação, seja ela de amor ou de amizade, nos fosse permitido fazer uma espécie de vistoria ao seu comportamento social. Se antes de decidirmos que fulano x será ou não nosso amigo, ou se fulano y será ou nosso namorado, fosse possível ver os seus poderes, um a um, pedir certificados de inteligência e de rectidão moral, e eventualmente consultar até a planta corporal do dito, para mensurar as dimensões de certas coisas, ou o seu nível de funcionamento. “Olhe, acho que o grau de tolerância quanto a opiniões diferentes é demasiado pequeno”. “Confesso que não fiquei demasiado impressionada com o sentido de humor da peça”. Mais do que isso, que tranquilidade não seria saber que poderíamos terminar a coisa com uma mera denúncia do contrato, sem justificações adicionais, sem pedidos de desculpa, sem o clássico “não és tu, sou eu”? Melhor ainda, já pensaram a serenidade do desfecho se recebêssemos uma denúncia dessas 2 ou 3 meses antes, a dizer uma coisa do tipo: “Cara namorada, serve a presente comunicação para te informar que tenciono terminar a nossa relação no dia 30 de Agosto de 2012, continuando até à referida data a cumprir todas as minhas obrigações de namorado?”. Como teríamos 3 meses para nos habituarmos à ideia, para nos depaixonarmos e o começarmos a desenvolver pelo dito o inevitável sentimento de repulsa, sem no entanto passarmos nesse momento pelo trauma da solidão e de o ver com outra, o coração poderia ficar rachado, mas dificilmente ficaria partido. Sim, procurar casa acaba por ter certas vantagens quanto comparada com a árdua tarefa de procurar amigos ou namorados. Ainda assim, não se revela tarefa fácil. As casas velhas têm problemas de esgotos e as casas velhas têm rendas de muitos dígitos. Face a isto, se houver por aí alguma ponte que me possa albergar ficaria muito agradecida.

2 comentários:

  1. Passei recentemente por uma experiência assim (creio que na mesma cidade) e de facto não é tarefa fácil. Mas entre as péssimas que ninguém aguenta e as fantásticas que toda a gente quer, por certo vai encontrar a casa perfeita! Boa procura!

    Cisca
    istoaquiloeoutrascoisas.blogspot.com

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  2. Procura noutra cidade... uma vez que essa cidade já é "um mundo tão pequeno.." (palavras de VeraR.)
    MC

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